Elas já foram sinônimo de êxodo rural e do crescimento desordenado das capitais e regiões metropolitanas. Hoje, são uma das preocupações das médias e pequenas cidades de Minas Gerais, que assistem, em muitos casos, ao avanço das favelas e dos dramas vividos por quem mora em situação precária, pendurado nas encostas, em vielas e ruas sem asfalto – muitas vezes sem água tratada ou esgotamento sanitário – e à mercê do tráfico de drogas e da violência.

Oficialmente, em Minas, só há favelas em 33 municípios, a maioria delas concentrada em Belo Horizonte e região metropolitana e em polos como Ipatinga, no Vale do Aço, Juiz de Fora, na Zona da Mata, Governador Valadares, no Rio Doce, e Montes Claros, no Norte do estado.

Em cidades pequenas, com menos de 50 mil habitantes, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), elas só existem em 11 municípios mineiros. Nos outros, são invisíveis, já que, para o instituto, as favelas, ou, melhor, aglomerados urbanos subnormais, para usar a mesma terminologia do IBGE, precisam ter pelo menos um conjunto de 51 casas, independentemente do tamanho da cidade, para serem reconhecidas como tal.
No entanto, para a Central Única das Favelas (Cufa), entidade que em setembro será premiada pela Organização das Nações Unidas (ONU), favela é qualquer aglomerado urbano com alto índice de exclusão social. E elas existem em muitas das regiões do estado, tanto que a Cufa já estendeu seu trabalho para cidades do interior do estado e de todo Brasil onde, oficialmente, não existem favelas.

“No interior, o que tem acontecido é a reprodução, em menor escala, das favelas dos grandes centros, com todas as suas mazelas, como exclusão social, falta de serviços básicos e comércio de drogas com estruturas organizadas e disputa de gangues de traficantes”, afirma Francis Henrique, de 36 anos, presidente da Cufa mineira e que assume em setembro o comando nacional da entidade. 

Padre Paraiso

A pequena Padre Paraíso é um exemplo da favelização em municípios do interior do estado. Cortada ao meio pela BR-116, a cidade, com cerca de 19 mil habitantes, chama a atenção de quem passa pela rodovia não por causa do portal que anuncia ser ali a entrada para o Vale do Jequitinhonha – uma das regiões culturamente mais ricas do estado, com uma população de quase 1 milhão de habitantes, que sofre com a seca prolongada, que afeta a economia da região –, mas pela quantidade de casas incrustadas em dois morros.

De longe, a imagem lembra os aglomerados dos grandes centros urbanos. De perto, a realidade não é diferente. Muitas moradias são precárias, e lá no topo de um dos dois morros, onde fica o mais recente conjunto habitacional da cidade, batizado de Bela Vista, as ruas são de terra e não há nenhum serviço público, como creche ou escola. 

EM INFRAESTRUTURA 

O lixão do município de Padre Paraíso,  fica a poucos metros de distância. Não há nem mesmo transporte coletivo, o que contribui para a evasão escolar e dificulta a vida da população, principalmente dos idosos.

No dia em que a reportagem esteve na cidade, muitas crianças não foram à escola. A desculpa é a ladeira íngreme que consome 30 minutos de caminhada para ser vencida sob o sol do meio-dia.

Consumidores de crack ficam zanzando pelo local e a cidade já registra casos de mendigos e moradores de rua. O Bela Vista é controlado por uma gangue de traficantes, que rivaliza com os que comandam a distribuição e venda de drogas no Bairro João de Lino,  no morro do lado. A violência domina toda a cidade. Somente este ano, já foram 11 assassinatos. Ao todo, já foram registrados, até maio deste ano, 29 crimes violentos, contra cinco no mesmo período de 2012, quando essas estatísticas começaram a ser divulgadas pelo governo do estado.
Em outro bairro, o Caldeirões, na região mais plana da cidade, as casas não têm titulação, as ruas não são asfaltadas e a água não é tratada. No local, moram cerca de 25 famílias que se cotizaram e pagam uma taxa mensal para uma pessoa ligar a bomba que puxa água de uma mina três vezes ao dia. Ao lado desse pequeno aglomerado, novas ruas começam a ser abertas para, segundo moradores, um conjunto que está sendo feito.

Um dos moradores do local é Arnaldo de Guerra Jesus, de 56, que comprou o terreno onde mora por R$ 3 mil. “Estava vivendo de aluguel e não aguentava mais pagar, aí comprei este terreno e construí esta casa”, conta Arnaldo, que sobrevive transportando pessoas em um carro particular. Do lado dele, reside dona Jovina Rodrigues, 71 anos, que deixou a zona rural de Joaíma, também no Vale, há cerca de oito anos e passou a viver de aluguel em Padre Paraíso. Sem conseguir pagar, foi morar na casa que o filho, que mora e trabalha em Mato Grosso, construiu para ela. A prefeita de Padre Paraíso, Neia de Saulo, não foi localizada para comentar a situação dos aglomerados da cidade.

Em 2010, existiam oficialmente 372 favelas em Minas Gerais, distribuídas em 33 municípios, com uma população de 598,7 mil habitantes

A menor cidade com registro de favela em Minas Gerais foi Bandeira, no Vale do Jequitinhonha, com 5..800 habitantes. É um aglomerado de 167 casas com 585 moradores, batizado de Colina. A maior é Belo Horizonte, com 87,7 mil habitações e 307 mil moradores em aglomerados.