Ano 2005, ocorreu o falecimento de Agenor Lima, o nosso saudoso Boca de Fulô, aos 95 anos, inesquecível personagem popular almenarense do século XX. Quando vivo, visando colher antigas informações, fomos buscá-lo para um bate papo em nossa residência. Encaminhávamos para abrir o portão, quando de súbito ele me segurou pelo braço, e fazendo suspense, alertou-me: “o jegue vai comer a parede da sua casa! É verde, ele vai pensar que é capim...”Por tratar-sede uma piada, dei uma risadinha. Então, ele complementou: “quando a parede acabar, o jegue vai comer o dono da casa!”Aí não tem jeito não, meu irmão...

 Convencido e auto-intitulado como boa pinta, ao ver alguém considerado aquém dos seus padrões de beleza, virava a cara para o lado, sem dó, e em bom tom exclamava: “feiúra dói!”. Daí, com o passar dos tempos, ao vê-lo, propositadamente alguém sempre lhe perguntava: “Agenor, feiúra dói?” Safando-se de assemelhar-se aos feios, respondia atribuindo feiúra ao indagador: “eu nunca lhe vi gemendo de dor...”

 Micareta de 2005, pouco antes da sua morte, topamos com o danado na avenida Olindo de Miranda, coincidentemente nas imediações de onde ele haveria de ser morto por atropelamento, e fomos beber cerveja numa barraquinha onde se encontrava um atrativo grupo de jovens foliãs metidas em tentadores shortinhos. Ao se ver nas proximidades, sem se conter, Boca de Fulô tentou esnobar: “o sonho da minha vida é ser feio!”Surpreendida por tão estranha declaração, uma das meninas virou-se a ele e perguntou: mais daí? Fazendo-se de tolo, Agenor respondeu perguntando: o quê? Mel de jataí?

Numa reservada conserva de homem para homem, ele garantiu que apesar de quase centenário, todo fim de festa no Clube Mineirão, pegava gatinha. Às festas ele realmente ia. Dançar, ele dançava. Mas pegar gatinha, ainda não tínhamos visto! Com o tempo, pesquisando, descobrimos que ao chegar do clube quase ao amanhecer, com os pés doloridos pelo peso dos seus 90 anos e lá vai fumaça, doido pra deitar, sempre pegava a gatinha mal acostumada em dormir em sua cama e a colocava num velho sofá. Mas passado alguns minutos, teimosa, ela retornava. Então o entendemos!

 Pelo fato de ser excessivamente conhecido, ao vê-lo, a molecada gritava: Agenor, Boca de Fulô! Sem papas na língua, automaticamente ele respondia: “sua irmã já me beijou!” O cabra era rimador. Entretanto, ao passar por um senhor ou senhora, educadamente dizia: “bom dia! Como vai o senhor? Como vai a família?” Mas ao cruzar por uma jovem, nem que fosse pelo canto da boca, o cumprimento era outro: “é uma gatinha!” Porém, ao topar com moleques de rua, murmurava: “nem olho que é pra não dá ousadia”. Contudo, caso não mexesse com ninguém, mexeriam com ele. Certo é que despercebido ele não passava!

 Bairrista convicto e inabalável, incondicional amante do seu torrão, Agenor afirmava: “Almenara é o melhor lugar do mundo pra se viver. Se faltar gás a gente pega lenha no mato. Se não quiser pagar água, pega no rio Jequitinhonha. Se precisar viajar, pode ir pelo rio, pelo terra, ou então entra no avião e vai pelo ar. Almenara é completa! Só falta uma emissora de televisão pra gente aparecer na telinha! É magnífico!”Dizia ele.

Época em que passou vendendo bilhetes de loteria, quando também ficou conhecido como “Agenor da Loteria”, mercando-os gritou: “olha a vaca minha gente! ”Daí, um senhor cego assustou-se, correu para o meio da rua, foi atropelado e morreu. Não tardou, a polícia o deteve como o engraçadinhocausador do acidente. Mas ao chegar à delegacia, Agenor mostrou o bilhete lotérico com o desenho da vaca e foi liberado. Eh, saudades de Agenor Boca de Fulô!