De acordo com a Promotoria de Justiça, Hely assumiu o cargo como prefeito de Taciba em janeiro de 2013 e, já nos primeiros dias de seu mandato, mais precisamente em 23 de janeiro de 2013, sancionou a Lei Complementar 003/2013, de sua autoria, que alterou a natureza do cargo de provimento em comissão de Secretário de Administração e Finanças para “eminentemente política”, e criou o cargo de Secretário de Assistência Social “sem nem ao menos especificar as suas atribuições” e, ainda, dispôs que a remuneração dos referidos cargos se daria por intermédio de subsídio.

Ainda segundo a ação, no dia seguinte, 24 de janeiro, o prefeito nomeou seu irmão Hedmar Batistela e sua esposa Juliana Ricci Batistela para os cargos de secretário de Administração e Finanças e de secretária de Assistência Social, respectivamente.

"Pela dinâmica dos fatos, é evidente que a alteração legislativa ocorreu de forma a propiciar a nomeação de seu irmão e de sua esposa para os quadros da administração, utilizando de expediente para tentar evitar a aplicação da Súmula Vinculante n.13 do Supremo Tribunal Federal", afirma o MPE.

A Promotoria também ressalta que não há “proporcionalidade, razoabilidade e moralidade” no ato de nomeação de seus parentes para os referidos cargos públicos. “Isto porque os requeridos Hedmar e Juliana não possuem habilitação técnica para exercer as funções para as quais foram nomeados e, além disso, as experiências profissionais de ambos se referem a cargos ocupados na administração em mandatos anteriores do prefeito municipal, ora requerido”, salienta.

A ação enfatiza que, "em todos os mandatos", Hely repete a situação de utilizar os cargos da administração municipal para beneficiar parentes e cônjuge. No documento, é citada uma outra ação civil, em que consta a nomeação de uma irmã do prefeito como secretária municipal de Educação, "de provimento em comissão".

"No atual mandato não foi diferente, tanto que desde o início imbuído desta intenção, alterou lei municipal com o pretenso fim de legitimar sua conduta. O que se verifica, na hipótese, é a intenção deliberada do prefeito de inserir seu cônjuge e seu irmão em cargos remunerados na administração municipal, o que viola, a um só tempo, a Constituição Federal e a Súmula Vinculante 13 do C. Supremo Tribunal Federal", pontua.

Com as nomeações, o MPE afirma categoricamente que Hely, na qualidade de prefeito, “praticou ato de improbidade administrativa”. “Juliana e Hedmar foram beneficiados pelo ato de improbidade, recebendo salários da administração, de modo que devem ser responsabilizados solidariamente”, frisa.

Outras violações citadas na ação são contra os princípios da impessoalidade, da moralidade, ético e da eficiência. No documento, a Promotoria também faz diversos questionamentos para chegar à conclusão de que houve "desvio de finalidade pública".

“Em verdade, como se falar em eficiência quando o nomeado não é escolhido em razão de suas qualidades, mas sim por questões familiares ou afetivas? Como suscitar questões referentes à igualdade de todos perante a lei, à imparcialidade e à objetividade, eis que não há chances para que o povo em geral dispute cargos públicos tão bem remunerados? Como se pode buscar a otimização no emprego das verbas públicas quando não têm destino público ou social, ao contrário, dirigem-se diretamente ao patrimônio de familiar do agente político? Não resta dúvida que a nomeação representa desvio de finalidade pública, motivada por interesses particulares e patrimoniais”, conclui a Promotoria.

A cronologia dos fatos torna nítida a intenção do requerido Hely Valdo em premiar sua esposa e seu irmão com cargos comissionados em posição 'estratégica' na estrutura do Secretariado de Governo, sancionando lei municipal de sua iniciativa para alterar a natureza dos cargos de secretário para política e, no dia seguinte, nomeando seus apaniguados, também demandados, que sequer possuem qualificação técnica que justificasse tal escolha, como já apontado". – Ministério Público Estadual, em ação civil pública por ato de improbidade administrativa

O Ministério Público ainda relata que, caso os nomeados fossem “realmente eficientes, melhores do que o restante da população, certamente teriam espaço em empresas privadas ou perante profissionais liberais, com bons vencimentos e chances de ascensão profissional”. “Não seria a eles interessante o risco de perder espaço no mercado de trabalho para, ao final do mandato, estarem desempregados. Dessa forma, o nepotismo desponta como válvula de escape para garantia de fartos vencimentos”, complementa.

A Promotoria afirma que a manutenção de Hedmar e Juliana “está a afrontar diretamente o texto constitucional”, violando princípios que devem nortear os atos da administração, sob pena de desvirtuamento de sua finalidade.

“A cronologia dos fatos torna nítida a intenção do requerido Hely Valdo em premiar sua esposa e seu irmão com cargos comissionados em posição 'estratégica' na estrutura do Secretariado de Governo, sancionando lei municipal de sua iniciativa para alterar a natureza dos cargos de secretário para política e, no dia seguinte, nomeando seus apaniguados, também demandados, que sequer possuem qualificação técnica que justificasse tal escolha, como já apontado”, aponta a Promotoria.

O MPE também entende que a colocação da esposa e do irmão de Hely como titulares das pastas de Assistência Social e de Administração e Finanças do município configura “ato estratégico do gestor, por se tratar de áreas com vinculação direta à imagem do prefeito”.

“Improbidade administrativa o ato praticado pelos requeridos Hely Valdo, Hedmar e Juliana revestem-se de dolo intenso e ofenderam os princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, eficiência, dentre outros”, conclui.

A liminar
A Promotoria explica na ação que o nepotismo é uma prática que ofende os “mais basilares princípios constitucionais administrativos”. “O seu potencial lesivo, é, portanto, proporcional à importância desses valores constitucionalmente albergados para o patrimônio imaterial da administração pública, devendo ser repelidos de pronto, pois, diariamente, estão sendo arranhadas as normas constitucionais da nossa República”, fala.

O MPE salienta que é necessário impedir o “ato administrativo maculado pelo nepotismo e com ofensa aos princípios constitucionais, com prejuízo ao patrimônio do município e, em última análise, ao próprio interesse público”.

“Ademais, a partir dos fatos narrados, percebe-se que o representante do Município vem perpetrando lesão irreparável ao patrimônio (material e imaterial) da Administração Pública e à própria consecução material do interesse público da comunidade. É que a ofensa ao princípio da moralidade e impessoalidade, já acima demonstrada, traz como consequente imediato um atentado à própria eficácia dos serviços públicos e demais prestações administrativas da localidade”, pontua.

Na ação, consta também que a manutenção do irmão e da esposa do prefeito traz “considerável perda de eficiência do órgão ou poder na execução de suas tarefas comezinhas, inteiramente voltadas à consecução do interesse público”.

“Assim, a lesão à eficiência administrativa e ao patrimônio público em geral está se protraindo no tempo, incrementando cada vez mais o seu grau de lesividade. É dizer: O nepotismo praticado já causou dano de difícil reparação e trará lesões ainda mais sérias ao sistema de administração e de serviços públicos municipais com a manutenção do status atual”, enfatiza.

Após expor todas as evidências de improbidade administrativa, a Promotoria pede a concessão da liminar. “Estão, portanto, devidamente configurados os requisitos expostos pela lei processual para a concessão da medida liminar para cessação dos efeitos dos atos administrativos que implicaram a nomeação do cônjuge e do irmão do alcaide para os cargos de secretário obrigando-se o município a providenciar os afastamentos imediatos dos requeridos Hedmar e Juliana com prejuízo da remuneração, sob pena de incidência de multa diária”, solicita o MPE.

Os pedidos
Além do pedido liminar, a ação civil pública ainda solicita a suspensão dos efeitos dos atos administrativos que nomearam Hedmar Batistela e Juliana Ricci Batistela para os cargos de secretário de Administração e Finanças e secretária de Assistência Social, respectivamente, “afastando os citados requeridos dos mencionados cargos com prejuízo dos vencimentos e imediatamente, proibindo, ainda, o exercício, por eles, de qualquer outro cargo ou função no âmbito da administração direta, indireta ou fundacional do Município de Taciba, sob pena de incidência de multa diária de R$ 10 mil , na hipótese de descumprimento e, também, sob pena de crime e nova prática de ato de improbidade administrativa”.

Também foi pedido o encaminhamento para a Câmara Municipal da cópia da “decisão liminar para ciência, adoção das providências cabíveis e leitura em plenário”. O pedido segue com a solicitação para “declarar nulos de pleno direito os atos administrativos que implicaram a nomeação” de Hedmar e Juliana, “bem como todos os efeitos dela decorrentes”.

O MPE pede a condenação do prefeito, de sua esposa e de seu irmão, “solidariamente, ao ressarcimento dos danos ao patrimônio público, especificamente da Prefeitura Municipal de Taciba, consistente nos valores ilegalmente pagos pelo município a Hedmar Batistela e Juliana Ricci Batistela, que deverão ser levantados por meio de cálculo contábil, tudo com inclusão de correção monetária, essa última desde a época do recebimento, mais juros de mora a contar da futura citação, cujo montante deverá ser calculado na forma da lei e apurado na fase processual apropriada, condenando-se ainda nas custas e demais despesas processuais”.

Por fim, a Promotoria pede para que os réus sejam condenados por ato de improbidade administrativa.

À causa foi dado o valor de R$ 305.369,46.

Outro lado
G1 entrou em contato com o prefeito de Taciba, Hely Valdo Batistela. Ele confirmou que seu irmão e sua esposa são funcionários da Prefeitura. Porém, frisou que se tratam de "nomeação política". "É um sistema diferente, com jurisprudência. Não estamos agindo de maneira errada, com decisões do Supremo Tribunal Federal, que entende que o agente político pode fazer isso. Não é ilegal. Além disso, não fui notificado sobre a ação", explicou.

Ele também ressaltou que seu irmão e sua esposa são advogados e qualificados para as funções. "Não é uma mão de obra qualquer. Eles são capacitados. No final, eles que são prejudicados por estarem na Prefeitura, pois teriam condições de ganhar muito mais em outros lugares", salientou Hely ao G1.

O prefeito pontuou que o posicionamento dado por ele é válido também para sua esposa e seu irmão.