Encostado no portão de casa, o aposentado Jésus Ferreira, 66, seca o suor com a manga da camisa e diz nunca ter visto uma estiagem tão severa quanto a que atinge a região nos últimos meses. Morador da comunidade ribeirinha da Ilha do Rio Doce, área que é sempre inundada em períodos chuvosos, ele brinca sentir até falta das épocas de cheia do rio. “Cresci em beira de rio e te digo: nunca vi algo assim”, comenta, preocupado com o baixo volume de água e os muitos bancos de areia ao longo do rio Doce.

O clima seco que é comum no inverno tem castigado os rios e cursos d´água que cortam o Vale do Aço. A essa constatação soma-se à falta de chuva, o que tem trazido impactos aos rios Santo Antônio, Doce, Piracicaba, córregos, ribeirões e nascentes. O leito dos rios está com volume bastante reduzido e com bancos de areia à mostra por toda a parte. Na altura da ponte metálica, na BR-458, entre os municípios de Santana do Paraíso e Caratinga, o cenário provoca espanto.

“Há um quadro crítico de estiagem não somente nessa região, como em outras do estado. Uma massa de ar seco predominou por mais de três meses, fazendo com que houvesse perdas por evaporação muito acentuada, sem uma recuperação disso em termos de atividade atmosférica. Agora, começamos gradualmente a melhorar, após um quadro bastante sério”, comenta o meteorologista do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), em Belo Horizonte, Luiz Ladeia.

O especialista informa que o forte calor que atinge a região nos últimos dias é um indicativo de que o preocupante cenário com a umidade relativa do ar na casa dos 20% comece a melhorar a partir de agora. “Há uma frente fria que pressiona essa massa de ar seco. Com isso as temperaturas subiram, caracterizando a pressão dessa frente fria sobre a massa de ar quente que estava bloqueando sua passagem. A tendência a partir dessa quarta-feira é a que umidade relativa do ar possa subir, com possibilidade de pancadas de chuva nessa região, inclusive”, ressaltou o meteorologista.

Conselheiro do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Piracicaba (CBH-Piracicaba) e extensionista agropecuário da Emater, Vinicius Perdigão ilustra que um dos maiores impactos da seca que assola a região leste está no município de Itabira, por exemplo. Na cidade do Médio Piracicaba, as precipitações não mantiveram de forma satisfatória o nível dos reservatórios e há racionamento do abastecimento de água em diversos bairros.

Ele salienta que durante o período da seca - de maio a setembro -, são registrados níveis e vazões mínimas recordes nas bacias hidrográficas dos rios Piracicaba, Santo Antônio e Doce. “É o nível mais baixo dos últimos 81 anos no Piracicaba, por exemplo. Em diversos pontos, é possível atravessar a pé sem nem molhar a canela”, afirma.

O presidente do CBH-Piracicaba, Iusifith Chafith Felipe, por sua vez, critica a falta de integração de órgãos responsáveis no planejamento de políticas que amenizem o problema. Os planos municipais de saneamento são a esperança de que as condições no entorno das bacias hidrográficas ganhem mais atenção do poder público. “Não tem água e a que tem está contaminada. Estamos preocupados não somente com a água, que está baixa, mas com sua qualidade”, frisou.